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segunda-feira, 2 de setembro de 2013

O acordo entre Macau e Cantão: Setembro 1920

(...) se até à subscrição do Protocolo Preliminar de Lisboa, em 26 de Março de 1887, e ao sequente Tratado de Amizade e Comércio subscrito em Pequim em 1 de Dezembro de 1887 e ratificado em 28 de Abril de 1888, a "Questão de Macau" foi preenchida essencialmente pelo problema da determinação e reconhecimento pela China do título da presença dos Portugueses em Macau, desde esse momento e até à 1ª metade do nosso século a mesma questão significou diferentemente o problema da delimitação marítima e terrestre de Macau, problema deixado em aberto precisamente pelo Artº 2 do Tratado de Pequim. Efectivamente, quase todos os momentos de mais acentuada controvérsia nas relações luso-chinesas têm na base problemas afins ou são dominados pela preocupação de definir os limites do Território: as negociações conducentes ao acordo oficioso firmado pelo Cônsul Cinatti e o Vice-Rei Li Hang Chang (1890) com vista à utilização das águas do Porto Interior, a polémica sequente ao incidente da apreensão do vapor Tatsu Maru em 1908, as Conferências intergovernamentais de Hong Kong em 1909, as múltiplas disputas decorrentes das obras do Porto de Macau que cumularam na dramática crise solucionada momentaneamente pelo acordo regional subscrito em Setembro de 1920 pelo Governo de Macau e pelo Governo Militar de Cantão, reacendida em Setembro de 1921 e prolongada para lá do termo da própria Conferência de Washington em circunstâncias que não cabe aqui desenvolver. 
 
 
 
 

A questão dita "dos limites de Macau" tornou-se assim a cause célèbre da política externa portuguesa no Extremo Oriente, catalisada simultaneamente por considerações de prestígio histórico e pela convicção de que a solução do problema dos limites despoletaria uma reacção em cadeia que, passando pela liberdade de construção de novo porto e pela concretização da projectada linha férrea Macau-Cantão, acabaria por trazer ao território o desafogo económico de outras eras, libertando-o do estigma da dependência das receitas do jogo e da exploração do ópio.
Não cabe nesta sede desenvolver a definição exacta do problema dos limites, e tão pouco expender ad nauseam usque os termos complexos da argumentação debitada por cada uma das partes em prol dos seus interesses. Importa, sim, notar que na abertura da 2a década do século XX o Governo Português se encontrava num impasse, sem possibilidade visível da solução de uma questão tida como vital, desencantado já - pela via dolorosa dos termos que conduziram à solução da crise de 1920 - de que a mudança de regime ocorrida em 1912 na China pudesse de algum modo alterar a rigidez monolítica do ditame que os mandarins de Pequim ou de Cantão sempre invocaram ao considerar as pretensões portuguesas no território: que Macau era território chinês ocupado pelos Portugueses, circunscrito à península do mesmo nome e totalmente desprovido de águas territoriais.
Perdida a grande oportunidade de se sentar à mesa do festim que as potências armaram na China depois da Guerra dos Boxers, desiludido também de conseguir da Inglaterra um apoio decisivo que esta potência, constrangida pela "diplomacy of imperial retreat", já não estava disposta a arriscar, o Governo Português agarrar-se-ia empenhadamente a todas as oportunidades que a nova situação do pós-guerra parecia sugerir em termos de uma interferência da comunidade das potências vencedoras no desenlace da "Questão de Macau".
Este estudo lida assim com um dos momentos em que mais alto subiram, tanto os temores como as esperanças, na solução do problema dos limites a um nível que extravasou o simples plano das relações bilaterais: a Conferência Internacional convocada para tratar da redução dos armamentos navais e terrestres, e das questões referentes ao Extremo Oriente, vulgarmente conhecida como a Conferência de Washington. A génese da Conferência de Washington deve ser buscada numa situação que - no elenco das grandes questões das relações internacionais da 1ª metade do século XX e entre as muitas resultantes da presença estrangeira em território chinês - se sobrepõe a qualquer outra pelas profundas repercussões na história moderna da China: a chamada "Questão de Shandong".
Excerto de um artigo da autoria de António Vasconcelos de Saldanha subordinado ao tema "A 'questão de Macau' na Conferência de Washington (1921-22)

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