Dois carimbos (vermelho - Pago em Macau com símbolo da monarquia portuguesa - e preto) confirmam o envio do Boletim da Província de Macau e Timor a partir de Macau para a 1ª Repartição do Ministério da Marinha e Ultramar (em Lisboa). Duas marcas postais para a história da filatelia do território.
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quarta-feira, 31 de julho de 2024
terça-feira, 30 de julho de 2024
"Precisávamos de vir a Macau"
Por esta altura há 100 anos os heróis da aviação portuguesa e mundial no início do século 20 já regressavam a Portugal. Partiram de Macau rumo a Xangai e dali para o continente americano chegando a Portugal só em Setembro.
"A nossa viagem tinha dois fins. Primeiro: sendo nós oficiais do Exército e patriotas, precisávamos de vir a Macau, terra portuguesa entre as terras portuguesas, onde Camões se inspirou para escrever Os Lusíadas. Aqui estamos. Segundo: sabendo-se que todas as nações se empenhavam na realização de grandes viagens aéreas, a Aviação Portuguesa não podia permanecer apática e indiferente e cumpria-lhe não deixar de participar condignamente na grande competição. Atingimo-lo também."
Discurso de Brito de Paes em Macau citado por José Manuel Sarmento de Beires no livro "De Portugal a Macau: a viagem do Pátria", Seara Nova, 1925.
Cartaz para a recepção em Lisboa |
segunda-feira, 29 de julho de 2024
Publicidade ao vapor Tak Shing
O Tak Shing entrou ao serviço da "Carreira Macau-Hong Kong" em Outubro de 1949. Usava inicialmente a ponte-cais nº 18 do Porto Interior. Depois passou a utilizar a ponte-cais nº 12. A viagem demorava 3 horas e meia. Já antes, desde meados da década de 1920 o navio operara na mesma rota sob o nome Sai On. Depois de cerca de duas décadas ao serviço como Tak Shing, em 1968 mudou de nome para Tung Shan. Foi desmantelado em 1974.
O Tak Shing, juntamente com o Tai Loy e o Fat Shan são os três grandes ferrys das décadas de 1950 a 1970. Na sequência de anúncios apresentados veja-se as diferentes formas como o nome é apresentado: Tak Shing, Tack Shing e Takshing. Pertencia à empresa Tay Yip.
1954 |
domingo, 28 de julho de 2024
Donativos para os sinistrados do ciclone em Portugal
A 15 de Fevereiro de 1941 uma forte tempestade sob a forma de ciclone atingiu vastas áreas de Portugal - incluindo a região da grande Lisboa - provocando mais de uma centena de mortes e avultados estragos materiais. O Estado Novo criou a Comissão Nacional de Socorros às Vítimas do Ciclone e para recolher fundos foi organizada uma campanha de propaganda através da Emissora Nacional e de alguns jornais.
Em Macau, apesar das dificuldades económicas vividas devido aos efeitos da guerra sino-japonesa - iniciada em 1937 - em especial o elevado número de refugiados que procuraram abrigo no território face à escassez de géneros alimentares, a sociedade mobilizou-se para angariar donativos para os sinistrados do ciclone em Portugal, nomeadamente a comunidade chinesa (com destaque para a elite comercial), desde as associações - Associação de Beneficência Tung Sin Tong, Hospital Kiang Wu, etc - aos comerciantes a título individual, que para o efeito criaram uma "comissão" liderada por Ko Ho Neng, a 27 de Março.
O Governo de Macau também participou activamente nas diversas iniciativas organizadas para angariar fundos.
Em várias edições de Março a Junho desse ano os jornais em chinês como o Va Kio e o Tai Chung Pou não só anunciaram de forma gratuita os eventos que se realizavam como publicaram notícias informando sobre a angariação de fundos. As acções mobilizaram ainda várias empresas locais. A Bao wen Lou, por exemplo, imprimiu os cartazes dos eventos que incluiram jogos de futebol, óperas, teatro, bazares etc...
Em Julho, ao fim de dois meses de acções, a comunidade chinesas angariou 31 mil patacas ( o equivalente a cerca de 300 mil patacas ao câmbio de 2024), de acordo com o cheque depositado pelo Banco Tong Tac Iun Kei (Av. Almeida Ribeiro, 96) na Caixa Económica Postal de Macau. A elite dos comerciantes chineses foi responsável por angariar cerca de metade do total. Sir Robert Ho Tung, por exemplo, doou 500 patacas. Huang Yu Qiao, outro comerciante chinês, dou 10.
A Voz de Macau 11.4.1941 |
sábado, 27 de julho de 2024
"Sua esposa deu à luz uma menina"
Neste "Annuncio" publicado n' "O Boletim do Governo de Macau" em Junho de 1866 "Joaquim Peres da Silva com muito prazer participa a todos os seus parentes e amigos, que no dia 6 do corrente mez, sua esposa deu à luz uma menina e espera que essa seja considerada na lista das suas criadas."
sexta-feira, 26 de julho de 2024
Bibliotheque Portative des Voyages
Na primeira metade do século XIX, histórias e contos de viagens famosas eram muito populares no Ocidente, nomeadamente os relatos do capitão James Cook, de Colombo, das viagens por África e as dos navegadores ao serviço da Companhia britânica das Índias Orientais, etc...
Foram publicadas em vários volumes primeiro em Inglaterra e depois traduzidas como é o caso da edição referida neste post, um volume - o 35 - publicado em Paris em 1817 - tradução de M. M. Henry et Breton - e onde se incluem dezenas de ilustrações da viagem de Macartney à China e à Tartária. Uma delas é a Gruta de Camões em Macau.
quinta-feira, 25 de julho de 2024
quarta-feira, 24 de julho de 2024
"Carruagens e cadeirinhas d'aluguel"
Art. 32 - Ninguem pode ter carruagens ou cadeirinhas d'aluguel para conducção de pessoas sem licença da camara mediante o pagamento da taxa ou imposto de 1 (pataca) por anno quanto as cadeirinhas e de 3 quanto as carruagens.
Art. 33 - Nenhuma cadeirinha ou carruagem pode ser empregada em serviço d'aluguel sem a previa numeração sob pena de 1 de multa
unico - Para a numeração de que trata este artigo os donos das carruagens e cadeirinhas a que elle se refere os farão inscrever na competente repartição da camara declarando o logar ou praça onde se acham postadas.
Art. 34 - Os numeros que as carruagens devem trazer na parte trazeira serão pintados nas proprias carruagens ou sobre uma chapa de qualquer metal que tenha a necessaria consistencia aparafusada em logar bem visivel.
Os desenhos são de George Chinnery. Feitos em meados do século 19 mostram "cadeirinhas de seda" e os respectivos condutores. Em baixo a tabela de preços praticados na cidade de Macau decidida pelo Leal Senado no referido código de posturas.
De acordo com inúmeros relatos desta época as ruas de Macau eram tão estreitas que quase não existiam as referidas carruagens. Veja-se este testemunho publicado em 1844 no "The New Monthly Magazine and Universal Register":
"The narrowness of the lanes prevents the use of wheel carriages none of which are therefore seen at Macao. Palanquins, carriages cabs & c rattle along Queen's road at Hong Kong but at Macao sedan chairs only are used and these differ from ours or rather from what ours were before they ceased to be in that the poles which are of bamboo and incline towards each other like the shafts of a gig are borne on instead of being supported by straps from the bearer's shoulders."
Uma "cadeirinha" numa emissão filatélica do século 20 alusiva aos "meios de transporte terrestres tradicionais" |
terça-feira, 23 de julho de 2024
"Jantar-dançante" no Bela Vista em 1954
Anúncio de "Jantar-dançante" no Hotel Bela Vista em Julho de 1954 com "música pelo Kiko Mendoza's Trio", todas as noites das 21 h. à 1 da manhã.
segunda-feira, 22 de julho de 2024
Tai Sang Steamship Company
Anúncio de 1938 no The Hong Kong Daily Press |
Os dois navios efectuavam duas ligações diárias: partidas de Hong Kong às 8 da manhã e 2h30 da tarde (do cais Leung Wing); partidas de Macau às 2h30 da tarde e 8h45 da manhã.
Adquiridos em segunda mão a outra empresa que operava no rio das Pérolas o "Macau"(antes chamava-se Paul Beau) e o "Kau Tung" (antes chamava-se Charles) foram duas embarcações a vapor que começaram a fazer a ligação marítima entre Hong Kong e Macau em Maio de 1938 pela recém criada Tai Sang Steamship Company, registada em Hong Kong.
Anúncio de 1941 |
Registo das embarcações em 1938
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domingo, 21 de julho de 2024
Rua da Prainha
Ainda hoje existe o topónimo Rua da Prainha (freguesia de S. Lourenço), referência a uma pequena enseada que existiu naquela zona. Se imaginarmos a actual localização tem-se bem uma ideia do quanto foi aterrado até aos cais do Porto Interior.
A designação em chinês remete para um edifício de três pisos (três é o primeiro caracter à esquerda) que existia na zona. Em cima uma referência à Prainha num edital de Agosto de 1866.
sábado, 20 de julho de 2024
"A side trip to Portuguese Macao"
Na edição de Novembro de 1960 - dedicada ao Japão e ao Extremo-Oriente - da The Rotarian John C. Caldwell* assina uma longo artigo intitulado "Travelling the Orient" onde explica aos leitores - potenciais viajantes - o que ver e fazer durante uma viagem de um mês pelo Oriente.
Quando escreve sobre Hong Kong Caldweel faz uma breve referência a Macau: "A side trip to Portuguese Macao, six square miles literally surrounded by Communist China, will take a night and day." Robert Borja é o autor dos desenhos.
sexta-feira, 19 de julho de 2024
60 mil euros por uma matrícula especial
quinta-feira, 18 de julho de 2024
Uma "Escola Cultural" em 1941
Maria Gomes assina este anúncio como directora da "Escola Cultural" publicado ao longo da várias edições de 1941 do jornal A Voz de Macau. A referida escola funcionava no número 6 da Rua do Campo com os seguintes cursos: Corte e Costura, Culinária Industrial, Culinária Doméstica, Fabrico de Cosméticos, Dança clássica, Instrumentos de Corda e Teoria da Música, Desenho e Pintura a Óleo. Cada curso custava duas patacas por mês.
quarta-feira, 17 de julho de 2024
O "Saludes" em Coloane
"Olhe, senhor, se calhar de ir ao restaurante do Saludes, em Coloane, fale-lhe do Ruivo (…) Quem me dera ir no seu lugar… Não voltava mais."
O excerto é retirado de uma das "Histórias de Macau", livro da autoria de Altino do Tojal que esteve em Macau em meados da década de 1970. A fala é de um taxista quando transporta um passageiro a caminho do aeroporto de Lisboa com destino a Macau...
O taxista tinha cumprido o serviço militar no território: "Ainda hoje puxo as orelhas por não ter ficado lá ficado, como fizeram o Saludes, o Alcines e outros rapazes do meu tempo. O Saludes montou um restaurante em Coloane e parece que vive feliz com uma chinesa. Aquilo é outro mundo (...) Devia ter ficado lá com a minha chinesa (...) Agora nem sou feliz em casa nem me agrada o trabalho."
"Era um restaurante de modesta aparência, na ilha de Coloane. Pertencia a um tal Saludes - português de gema, ao que me tinham dito - e entrei ali, num abafado fluir do dia, mais pelo desejo de falar do que por vontade do estômago."
No Anuário de Macau relativo a 1978 e 1979 surge como morada do Saludes: "Povoação Interior, nº 13, Coloane."
A foto dos primeiros anos da década de 1980 é de Eugénio Novikoff Sales (à esq.) e foi tirada frente ao restaurante. Ao centro está o conhecido pintor de Hong Kong, Ha Bik Chuen. Saludes está à direita. Eugénio, também pintor, lembra-se de alguns dos pratos da ementa: "camarões fritos, bacalhau, bife a cavalo e cozido à portuguesa"...
Ainda carece de confirmação, mas tanto quanto consegui apurar Saludes começou por cumprir o serviço militar em Macau, depois foi para a polícia e mais tarde dedicou-se à restauração. Esteve ainda ligado aos primórdios do que viria a ser o hoje conhecido como restaurante Fernando's, em Hac Sa.
terça-feira, 16 de julho de 2024
Casa à venda no "Campo de Sam Francisco"
Anúncio publicado em "O Boletim do Governo de Macau", Agosto de 1866
"PARA VENDA
A CASA no campo de Sam Francisco contigua ao Mosteiro de S.ta Clara pelo lado do norte; e que está actualmente occupada por Sr. Cantuarias. O abaixo assignado receberá os offerecimentos dos que a quizerem comprar, até ao dia 31 do corrente. Macau 11 d'agosto 1866. MANOEL PEREIRA."
Nota: corresponde à zona do actual Jardim de S. Francisco. Dos tempos dos Mosteiro de Santa Clara resta o topónimo Rua de Santa Clara, junto ao referido jardim.
segunda-feira, 15 de julho de 2024
Filmes em exibição: Julho de 1954
Há 70 anos - em Julho de 1954 - eram estes os filmes em exibição - alguns com três sessões diárias - nos cinemas Capitol, Apollo, Vitória e Império. "Legendas em português" e "tecnicolorido" eram alguns dos argumentos apresentados nos anúncios.
domingo, 14 de julho de 2024
Emissões com o valor facial de 25 patacas
O valor facial de 25 patacas é uma raridade nas emissões numismáticas de Macau. A primeira emissão é de 1907 num total de 50 mil notas impressas em Londres.
Na frente: Escudo de armas português com coroa, em cima à esquerda. O selo do Banco impresso no centro e gravado em relevo dentro dum círculo, à direita. Data parcialmente impressa da seguinte maneira: “___de___de 19___”. Uma assinatura à mão, em baixo à esquerda e duas assinaturas impressas, em baixo à direita. Cor azul escura sobre vermelho.
No verso: Escudo de armas português com coroa, no centro. Cor azul escura sobre vermelho.
Algumas destas notas foram enviadas posteriormente para Timor onde tinham o carimbo "Pagável em Timor".
Em 1944 surgiram os "certificados" no valor de 25 patacas (retirados de circulação em 1947).
A 'terceira' emissão - denominada Pagode - é de 1945 (cédula) e foi impressa em Inglaterra.
Uma 'quarta' emissão com o valor facial de 25 patacas surge em 1948 denominada "Luís de Camões. Visavam a substituir as de igual valor da emissão Pagode (1945) que entretanto tinhams surgido falsificadas. Um "aviso" no Diário do Governo (Portugal) de 25 de Maio de 1949 explicita as condições desta "emissão das notas de novo modelo".
sábado, 13 de julho de 2024
Uma lição bem à Oriental
Tinha chegado à Ilha da Taipa (Macau) havia apenas um mês, comandava o único posto militar lá existente, nessa ilha isolada de Macau e da Ilha de Coloane. Perto do quartel, havia uma carreira de tiro militar e na parte final da mesma estava localizado um imenso cemitério chinês.
Na cultura e geomância chinesa e seu Fong Soi, os cemitérios devem serem construídos nas colinas e virados para o mar, sempre que for possível, dando assim o maior descanso aos defuntos e sorte perpétua, porém este na ilha da Taipa tira só uma vista para o mar, visto ficar no sopé de uma montanha.
Os familiares vão junto das campas de seus antepassados orar e ofertarem comida, bebidas e frutas. Muitas das campas são enormes, quase sempre com um formato de ferradura. Por altura dos dias de finados chinês, cujos dias variam segundo o calendário chinês, este ano de 2008, se processou em Abril e será celebrado em Outubro, as famílias dos falecidos vão em romaria prestar homenagem aos seus antepassados lhes levando, depende das posses de cada uma, um leitão assado, uma galinha já cozida, arroz, vinho e fruta, queimando três pivetes e na posição de sentido fazem três vénias, curvando a cabeça em direcção ao chão e queimando panchões para afugentarem os diabos, estas práticas seguem as regras milenárias herdadas.
Foi por uma dessas alturas que um soldado da minha companhia passou pelo cemitério e lá viu um leitão assado e o roubou, porém foi visto por um dos familiares. O referido soldado, por sinal alentejano, convidou alguns dos seus colegas, foram comprar cervejas e comeram o leitão.
Os chineses depois de se reunirem com seus familiares foram até ao quartel e perante mim relataram o sucedido; fizeram-no calmamente e desejavam que eu mandasse chamar esse militar para lhe dizer que tinha feito uma má acção.
Sobre o meu comando tinha somente 10 militares que chamei à minha presença, tendo o chinês reconhecido o militar. Mandei retirar os restantes e fiz-lhe ver que o procedimento que tinha tido, não era correcto, visto que além de ter cometido um roubo, tinha igualmente ofendido os familiares do falecido e a sua cultura.
Esperava eu uma resposta pedindo desculpas ao senhor ali presente, mas a falta de cultura do militar levou-o a dizer que tinha somente tirado e comido o leitão, pois era um desperdício ali ficar, visto que o falecido o não iria comer.
O senhor chinês que se comunicava comigo em inglês, sabia algo de português e entendeu, por alto, mas acertadamente, o que o militar tinha dito e ficou ofendido; disse que ele era um pirata em correcto português, fez o mal e não quer aceitar as responsabilidades.
O militar ia ripostar quando eu o mandei calar e pedir desculpas ao senhor, e se ele continuasse com a teimosia de ser mais superior que o chinês eu o castigaria. Só assim pressionado olhou para o chinês e disse com voz baixa, quase por favor: desculpa!
O senhor então pediu-me para eu traduzir para ele estas palavras, que jamais me esquecerei e que deram uma enorme lição de civismo e de humanismo: "Esse soldado falou ser um desperdício nós colocarmos um leitão e toda a comida na campa do falecido, se ele jamais a irá comer, mas esta é a nossa tradição e terá que ser respeitada por todos quer seja chinês ou ocidental, nós sabemos perfeitamente que o nosso antepassado jamais irá comer tudo aquilo que lhe ofertamos. Da mesma forma que os vossos antepassados jamais irão sentir o odor das flores que colocam em suas campas, porém vós o fazeis por ser esse o vosso culto que nós respeitamos".
Desta enorme lição de moral poderemos tirar as nossas ilações, pois cada povo tem sua religião, suas tradições e suas culturas que devem ser respeitadas, só assim no mútuo entendimento e tolerância se poderá viver em paz e harmonia.
Na cultura e geomância chinesa e seu Fong Soi, os cemitérios devem serem construídos nas colinas e virados para o mar, sempre que for possível, dando assim o maior descanso aos defuntos e sorte perpétua, porém este na ilha da Taipa tira só uma vista para o mar, visto ficar no sopé de uma montanha.
Os familiares vão junto das campas de seus antepassados orar e ofertarem comida, bebidas e frutas. Muitas das campas são enormes, quase sempre com um formato de ferradura. Por altura dos dias de finados chinês, cujos dias variam segundo o calendário chinês, este ano de 2008, se processou em Abril e será celebrado em Outubro, as famílias dos falecidos vão em romaria prestar homenagem aos seus antepassados lhes levando, depende das posses de cada uma, um leitão assado, uma galinha já cozida, arroz, vinho e fruta, queimando três pivetes e na posição de sentido fazem três vénias, curvando a cabeça em direcção ao chão e queimando panchões para afugentarem os diabos, estas práticas seguem as regras milenárias herdadas.
Foi por uma dessas alturas que um soldado da minha companhia passou pelo cemitério e lá viu um leitão assado e o roubou, porém foi visto por um dos familiares. O referido soldado, por sinal alentejano, convidou alguns dos seus colegas, foram comprar cervejas e comeram o leitão.
Os chineses depois de se reunirem com seus familiares foram até ao quartel e perante mim relataram o sucedido; fizeram-no calmamente e desejavam que eu mandasse chamar esse militar para lhe dizer que tinha feito uma má acção.
Sobre o meu comando tinha somente 10 militares que chamei à minha presença, tendo o chinês reconhecido o militar. Mandei retirar os restantes e fiz-lhe ver que o procedimento que tinha tido, não era correcto, visto que além de ter cometido um roubo, tinha igualmente ofendido os familiares do falecido e a sua cultura.
Esperava eu uma resposta pedindo desculpas ao senhor ali presente, mas a falta de cultura do militar levou-o a dizer que tinha somente tirado e comido o leitão, pois era um desperdício ali ficar, visto que o falecido o não iria comer.
O senhor chinês que se comunicava comigo em inglês, sabia algo de português e entendeu, por alto, mas acertadamente, o que o militar tinha dito e ficou ofendido; disse que ele era um pirata em correcto português, fez o mal e não quer aceitar as responsabilidades.
O militar ia ripostar quando eu o mandei calar e pedir desculpas ao senhor, e se ele continuasse com a teimosia de ser mais superior que o chinês eu o castigaria. Só assim pressionado olhou para o chinês e disse com voz baixa, quase por favor: desculpa!
O senhor então pediu-me para eu traduzir para ele estas palavras, que jamais me esquecerei e que deram uma enorme lição de civismo e de humanismo: "Esse soldado falou ser um desperdício nós colocarmos um leitão e toda a comida na campa do falecido, se ele jamais a irá comer, mas esta é a nossa tradição e terá que ser respeitada por todos quer seja chinês ou ocidental, nós sabemos perfeitamente que o nosso antepassado jamais irá comer tudo aquilo que lhe ofertamos. Da mesma forma que os vossos antepassados jamais irão sentir o odor das flores que colocam em suas campas, porém vós o fazeis por ser esse o vosso culto que nós respeitamos".
Desta enorme lição de moral poderemos tirar as nossas ilações, pois cada povo tem sua religião, suas tradições e suas culturas que devem ser respeitadas, só assim no mútuo entendimento e tolerância se poderá viver em paz e harmonia.
Texto de António Cambeta em 2008
sexta-feira, 12 de julho de 2024
Envelope CVP - Serviço de Prisioneiros Guerra
Envelope com carimbo de 30 de Agosto de 1943 e a inscrição da Cruz Vermelha Portuguesa - Serviço de Prisioneiros de Guerra enviado de Macau para Lisboa com carimbo da Cruz Vermelha local e dos CTT de Macau. Na vertical um carimbo em japonês que significa correio de prisioneiros de guerra. Macau manteve-se neutral durante a segunda guerra mundial mas os japoneses ocuparam Hong Kong por onde o correio tinha de passar pelo que este carimbo era vital para que a correspondência pudesse ser entregue no destinatário, por sinal, o secretário-geral da CVP em Portugal.
1943 (30 Aug) Portuguese Red Cross POW cover from Macau to Lisbon, applied with Portuguese Red Cross circular h.s. in red, vertical “POW Mails” h.s. in Japanese and hexagonal Macau d.s. Very scarce POW example from Macau which remained netural during WWII.
1943.8.30 葡國紅十字會戰俘封,由澳門寄里斯本,鈐葡國紅十字會紅色圓戳、日文“俘虜郵便”直戳及澳門六角形日戳。澳門在二戰期間為中立,故戰俘郵件極為稀罕少見。
Este tipo de correio foi criado para contactar os prisioneiros de guerra. Em Hong Kong os japoneses fizeram muitos prisioneiros, nomeadamente portugueses/macaenses que ali viviam. Nestes dois exemplos mostra-se uma correspondência, também de 1943, efectuada a partir de Macau e tendo como destinatário um desses prisioneiros.
Luiz Gonzaga Gosano (1919 Hong Kong - 2014 EUA) jogava hóquei em campo. Foi feito prisioneiro a 26 de Dezembro de 1941 (fazia parte da companhia nº 5 do Hong Kong Volunteers Defense Corps) e estava no campo de prisioneiros Shamshuipo (daí a designação S no endereço). Quem lhe escreve é Avelina Maria Gosano, a irmã mais nova (1917-2013).
Sugestão de leitura: "Macau 1939-1945: os anos da guerra", João F. O. Botas, IIM (2012).